PEIXOTO

O barulho estridente do velho relógio de corda cromado Herweg marcava exatamente cinco horas e trinta e sete minutos. A luz do sol timidamente surgia no firmamento naquela manhã de inverno, dançando com o solfejo de um canário da terra destemido repousado na janela. 

Antes de cerrar o barulho da sirene do velho relógio, Peixoto já estava de pé, vestido com camisa do time colorado de coração, jaqueta forrada com lã de ovelha, calças jeans surradas, e botas de grosso solado de madeira. 

Com a adaga de prata, herança do avô mestiço, preparou o fumo de corda enquanto a água fervia no fogão a lenha para o primeiro mate da manhã. Tirou do armário uma fôrma preenchida com pão sovado, coberta com um pano de prato bordado pela tia Nina, uma senhora quase centenária de cabelos alvos e sorriso largo, que sempre lhe visitava aos domingos depois da missa na Paróquia de Santo Amaro. 

Sentado numa confortável poltrona acolchoada com um pala, Peixoto queimou seu fumo de corda no cachimbo, enquanto bebia um mate amargo, esquentando o seu corpo ainda tenaz, que pouco acusava os duros anos de trabalho no campo. 

Ao longe, onde a vista ainda alcançava o foco, avistou um gaudério se aproximando da porteira. Peixoto passou a mão na cintura, tateando a garrucha, então ouviu de longe a voz do tiatino indagando: “Senhor Peixoto mora aqui”? Após um belo trago no fumo, com a voz rouca e viril, Peixoto respondeu: “Cavalo bom e homem valente a gente só conhece na chegada”.

Victor Matheus