PEQUENOS DETALHES

Andei aos cochichos, conflitos e confidencias secretas com minha existência nos últimos dias. A enfermidade inesperada que nocauteou minha saúde na semana passada me colocou em “modo de espera” por longos quatro dias, numa corrida de revezamento entre minha cama e os “aposentos reais” de uma pessoa fragilizada por uma infecção alimentar. Se não vi a luz divina com esta experiência, pelo menos tive longas horas solitárias para refletir sobre minha jornada nessa vida.

Percebi nesse exílio forçado o quanto a vida é frágil em sua matéria, e como é infinita em sua abstração. Ao passo que meu corpo se diluía em líquido descendo ralo a baixo, intercalado com dores abdominais fortes, pingos excessivos de suor e noites sem dormir, tive tempo mais que suficiente para rever meus conceitos, olhar para o passado, traçar metas, e reavaliar meu presente. Olhei o mundo ao redor, e reencontrei, mais uma vez, a beleza da vida nos pequenos detalhes.

Meu corpo fragilizado só implorava pela ausência de dor e mal estar. Meus olhos buscaram incessantemente algo que desviasse o foco da minha mente durante aquela transição de homem-rei-no-trono e cidadão-comum-saudável. Tive tempo mais que suficiente para relembrar outra vez o como é bom sentir-se amado e querido, mas também constatei uma verdade: Ao passar do tempo e de nossa vida, poucos são os verdadeiros amigos que permanecem, e muitos são aqueles que deixam de lado qualquer tipo de relação fraternal conosco por motivos alheios a nossa vontade.

Após minha recuperação dessa penitência física em forma de doença, um sentimento forte e de necessidade bateu em meu peito. Uma vontade quase infantil de rever os antigos amigos, aqueles que temos um carinho imenso mas que por circunstâncias alheias a nossa vontade, tomaram outros rumos na vida. Refiz na memória um pequeno catálogo dos grandes momentos da minha vida e desses, quais ocorreram com a presença de amigos importantes, e percebi o quanto sou privilegiado por ter na vida, experimentado histórias incríveis com amizades tão distintas, perfis tão opostos, mas todos com algo em comum: pessoas de bom coração.

Resolvi que não deixarei mais a corrida insana da vida, os compromissos, o trabalho, as obrigações e deveres sufocarem mais outros espaços dos meus dias, aqueles que dedico aos meus pais e irmão, a minha esposa e nosso bebê que está crescendo em seu ventre e muito menos aos amigos, mesmo os distantes. Comecei desde já um pequeno exercício diário, em buscar na memória aqueles que fazem parte da minha história, e resgatá-los para o meu cotidiano.

Mensagens no celular, facebook, twitter, telegramas, cartas, podem não ser o suficiente, mas já são passos importantes para essa retomada de pequenos detalhes que passam despercebidos de nosso cotidiano. É verdade que são muitas as amizades que cultivei ao longo da minha vida neste lugar, e mesmo sendo algo não tão fácil de fazer, eu procuro agora estar presente na vida de cada um que cruzou o meu caminho e mudou minha forma de ver o mundo. Como um passo de cada vez, resolvi resgatar pedaços da minha história que se espalharam por aí, e a vida já têm me retribuído. Noite passada, sem muito esforço, encontrei alguns amigos do tempo de escola num lugar pouco provável. O encontro foi breve, mas a troca de energia positiva, aquele abraço sincero, e um sentimento de saudade e conforto por reencontrá-los e vê-los tão bem seguindo suas vidas me confortou o coração. Realmente devemos olhar mais o mundo ao nosso redor, enquanto ainda há tempo. Talvez aquele amigo precise de sua mão estendida, mas você anda ocupado demais para perceber isso.

* Victor Matheus